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Sinfonia de um prédio só_Catálogo_VERSÃO DIGITAL

GABRIEL BISELLI
November 16, 2014
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Sinfonia de um prédio só_Catálogo_VERSÃO DIGITAL

projeto audiovisual sobre o monumento à josé inácio peixoto, cataguases mg
caio sertório, gabriel biselli, glauber triana e luiz solano
orientação prof. joana mello e denis joelson
setembro/novembro 2014

TEASER http://vimeo.com/111066732

GABRIEL BISELLI

November 16, 2014
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Transcript

  1. SINFONIA DE UM PRÉDIO SÓ C A I O S

    E R T Ó R I O G A B R I E L B I S E L L I G L A U B E R T R I A N A L U I Z E D U A R D O S O L A N O
  2. PRÓLOGO DO BREJO CARIOCA “Segundo meu desenho: inicialmente o solo,

    coberto de vegetação; os rios de circulação p a s s a m a t r a v é s d e l e e o s p o r t o s d e estacionamento estão rodeados de árvores. Eis que uma autoestrada sobre pilotis estende-se a perder de vista. Dominando as árvores ou correndo no meio de suas copas, entre folhagens e gramado, as ruas “elevadas”, façamos construções de dois ou três andares, onde se encontram os cafés, as lojas e os passeios. Aqui, os vastos edifícios destinados à moradia, dotados de serviços comuns, sem pátios e abertos para parques. Eis os arranha-céus todos de cristal, que reluzem na atmosfera. Mas nós permanecemos homens, homens de sempre, com nossos olhos a 1,70 metros acima do solo. Eis o espetáculo autêntico da cidade moderna, intensa e ardente: uma sinfonia de vegetação, folhagens, ramagens, relvas e estilhaços de diamantes por entre os bosques. Sinfonia! Vejam com que lirismo e progresso nos animou, com que utensílios as técnicas modernas nos dotaram. Jamais se viu semelhante coisa! Ah não, pois começou uma nova época, movida por um novo espírito.” LE CORBUSIER. Precisões sobre um estado presente da arquitetura e do urbanismo. São Paulo, Cosac e Naify, 2004, p. 153. “Eu sonhei com vocês: todo o Brasil espiando pra Cataguases e Cataguases dando as costas a vocês. Cidade pequena é assim mesmo. Tem raiva de quem fica maior do que ela dentro dela. Vocês, poetas de cidade pequena fizeram de Cataguases uma cidade grande. Porque é grande tudo quanto se vê de longe, inclusive certas coisas pequenas. Queiram bem a Cataguases que não quer bem a vocês. Cataguases é pequena, mas vocês só são grandes porque são poetas de Cataguases” ALMEIDA, José Américo de. “Mensagem ao Grupo Verde”, rev. Verde out. 27, in: “A revista Verde e o Movimento Modernista em Cataguases 1927-29).
  3. SINFONIA DE UM PRÉDIO SÓ Cataguases é atravessada pela Estrada

    de Ferro Leopoldina. O arquétipo da cidade é desenhado por engenheiros militares sob comando do Coronel Merlière. Tantas cidades brasileiras mostram como essa é também uma das mais mineiras cidades desse país: Aquartelamento militar, expulsão e catequização de índios à beira rio, capela para se consolidar. O Arraial de Meia Pataca elevado a Vila, mostra-se próspero conforme o café beneficia a chegada da ferrovia; ferrovia traz estação, o que articula toda uma região agora progressista; progresso traz diálogos, entre pequena cidade e capital federal, diálogos trazem vanguardas. No mais, é uma cidade como tantas outras cidades. À beira de um rio como tantas outras, com pontes metálica como tantas outras pontes metálicas. Fora o ambiente moderno, a cidade é comum. A grande locomotiva industrial aspirará modernidade sem ser moderna. IMAGEM E FAUSTO Aspiração ao moderno é aspiração à imagem. Imagem é poder para uma classe social, emergente e dominante. Sua emergência é acarretada por diálogos com a capital, Rio. Seus diálogos interpretam relações entre o surgimento do cinema de Humberto Mauro e a produção da Revista Verde, na década de 20, anteriores ao processo de criação imagética da cidade. Essa criação depende de uma classe burguesa. A concentração de poderes econômicos e políticos em torno da mesma família, representada por Inácio Peixoto, modifica a cidade. Em um claro sentido de autoafirmação, são construídos edifícios simbólicos como o teatro e a igreja. O fato da família Peixoto ter se aproveitado do fim da Era Vargas com a consequente eleição direta à prefeitura é o que garante todas essas transformações. Nota-se a construção dessa imagem burguesa no painel de Portinari encomendado pelos operários de Peixoto para o monumento em sua homenagem. Ali o artista parte de uma organização espacial clássica e elabora figuras geometrizadas ainda decorrentes da influência cubista, mostrando o trabalho das mulheres fiandeiras. A temática trata a participação feminina no trabalho de fiação e tecelagem. O mote é a sua exibição pública, a constituição de sua imagem. No entanto, como na trama de Goethe – onde Mefistófeles não cria uma situação suficientemente plena para que Fausto deseje aquele momento para sempre – o monumento, o exibicionismo burguês e a imagem da cidade não solidificam a utopia moderna.
  4. UM COLÉGIO ARQUITETÔNICO DA EUROPA AO BREJO CARIOCA Cataguases define

    a relação entre a elite burguesa local e a vanguarda moderna ligada a arquitetura. Temos em Inácio Peixoto por intermédio de seu amigo e escritor Marques Rebelo – com quem fundou a revista Verde – a encomenda de sua residência, pelo então jovem Oscar Niemeyer, inaugurando o relacionamento frutífero entre a gramática moderna carioca e a cidade mineira. A recepção local a arquitetos como Francisco Bolonha, Carlos Leão, entre outros, tornam a cidade o ambiente para essa escola arquitetônica se afirmar. Bolonha nunca escondeu sua preferência de atuação no interior do país. Em Cataguases o arquiteto amadurece sua produção conforme suas oportunidades. As fachadas e a transparência do Monumento à José Inácio Peixoto buscam a diluição dos limites entre interior e exterior, estabelecendo a continuidade espacial moderna e diluindo a separação entre cultura, arte, natureza e cidade. Nesse sentido, a presença da escultura de Bruno Giorgi e dos azulejos de Portinari estendem o espaço da arte para o espaço urbano. A PRIMAZIA PELO ÂNGULO RETO “A descrição do impacto perceptivo provocado pela visão de uma rocha vertical formando com a linha do horizonte um angulo reto, esse “lugar de todas as medidas”, serve a Le Corbusier para retomar um dos pilares teóricos do purismo, a primazia do angulo reto, ampliando-o agora para abarcar toda a extensão exterior ao volume arquitetônico como objeto da ação arquitetônica. A fórmula le dehors est toujour un dedans sintetiza, no âmbito teórico, o suporte para a redefinição do estatuto da ação arquitetônica presente na consigna do abandono das pequenas obras privadas em favor dos grandes trabalhos de conjunto. Ou, em outras palavras, é o fundamento conceitual para a afirmação da unidade do sistema arquitetônico à escala da cidade e da paisagem”. MARTINS, Carlos A. Ferreira. Uma leitura crítica in: Precisões sobre um estado presente da arquitetura e do urbanismo. São Paulo, Cosac e Naify, 2004, p. 287 À medida que o olhar da câmera se afastava a água, a pedra e o aço fundiam suas identidades, os sólidos se tornavam lustrosos, os translúcidos se tornaram densos. A função é ser honorífico, quiçá diplomático por representar valores culturais de uma nova sociedade, distanciando-se de seu passado (CURTIS, 2008). O comentário poderia estar ligado ao Monumento à Inácio Peixoto em Cataguases, mas refere-se ao Pavilhão de Barcelona. A República de Weimar desejava projetar uma imagem de abertura, liberdade e modernidade. O monumento em Cataguases se mostra aberto, livre e moderno. Ele mostra o que poderia ser feito na época, é claro, simples e honesto.
  5. APRENDENDO COM BAHAMAS Uma casca de tijolos de barro e

    tesouras de madeira compõem o cenário. As paredes de dry- wall os tocam. Há cola, pregos, parafusos. No lugar do maquinário histérico, das agulhas velozes que estilhaçavam os tecidos translúcidos há agora máquinas de sorvete. A baunilha substituiu a fuligem. Tapam-se as janelas, ligam-se os climatizadores. A intensidade das locomotivas dão lugar aos rodízios dos carrinhos de compra. Balões de gás hélio estão nas mãos da nova espécie nessa esfera que ela própria criou. O cosmético é agora o novo cósmico... (KOOLHAAS, 2001) A FAMÍLIA E OS AMANTES Essa sequência trata do projeto de homem social proposto pelo movimento moderno. A escultura de Bruno Giorgi é um amálgama das três entidades tradicionais necessárias para se formar uma família: o pai, a mãe e o filho. Esses iguais habitam um ambiente transparente desenhado, exclusivamente, para os novos homens. O corpo, que pontua o espaço, quebra a unidade arquitetônica. Assim como G. Kolbe faz no Pavilhão Barcelona de Mies van der Rohe (SOLÀ-MORALES, CIRICI e RAMOS, 1993), o volume figurativo rompe a abstração dos planos. Importante destacar a presença de pedestal em ambos os casos. No entanto há, propositalmente, a presença humana nessa cena em contraste com a ausência do universo individual na bibliografia moderna de matriz corbusiana, sobre tudo. Os atores sempre separados, que se cruzam mas não se tocam, se olham mas não se encontram, como quem questiona a perenidade do metal. O título Os Amantes refere-se a La Fuente De Los Amantes que Luis Barragán construiu em um espaço público do Distrito Federal, México. As questões fundamentais que Barragán sintetiza de maneira simbólica nesse trabalho tratam da paisagem criada pela geometria regular e abstrata, com sentido também horizontal, mas que é aqui quebrada pela fluidez e instabilidade da água corrente além do propriedade dinâmica que o conjunto adquire, quando cruzado por cavalos – não se trata de um objeto decorativo, a fonte é na verdade uma piscina para cavalos (ANDA ALANÍS, 1989). Sendo assim que a união entre a figura feminina (água) e a masculina (cavalo) se dá. Deve- se notar ainda, a presença/ausência (uso) do espelho d’água no Monumento brasileiro e sua total desconexão ou distanciamento com a família e os amantes.