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Tese - o dia da defesa - Março, 2015

Tese - o dia da defesa - Março, 2015

O Dilema do porco-espinho: uma abordagem interacional do humor em relações próximas
Orientador: Prof. Fernando Afonso de Almeida
Co-orientadora: Prof. Maria do Carmo Leite de Oliveira

Letícia Stallone

August 04, 2015
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Transcript

  1. Doutoranda Letícia Rezende Stallone Universidade Federal Fluminense – UFF Orientador:

    Prof. Dr. Fernando Afonso de Almeida – UFF Coorientadora: Prof. Dra. Maria do Carmo Leite de Oliveira – PUC-RJ O dilema do porco-espinho: uma abordagem interacional do humor em relações próximas
  2. Contexto de pesquisa Humor nas relações próximas como elemento paradoxal:

    Pode funcionar de modo a calibrar as relações e, ao mesmo tempo, ameaçar estas relações.
  3. Contexto de pesquisa Humor nas relações próximas como elemento paradoxal:

    Pode funcionar de modo a calibrar as relações e, ao mesmo tempo, ameaçar estas relações. 1- Como o humor é construído interacionalmente? 2- Que tipos de humor ocorrem nos encontros de amigos? 3- Que funções eles desempenham nas conversas?
  4. Objetivos • Explorar a complexidade e ambivalência do humor em

    relações marcadas pela proximidade e o afeto
  5. Objetivos • Explorar a complexidade e ambivalência do humor em

    relações marcadas pela proximidade e o afeto 1- Examinar como as sequências de humor são construídas interacionalmente; 2- Identificar os tipos de humor que emergem nesses encontros e 3- Descrever as funções do humor a partir dos tipos de humor identificados.
  6. Relevância do estudo “Para muitos de nós, o humor é

    mais do que uma agradável decoração da vida; é uma peça complexa do equipamento da vida, um modo de ataque e uma linha de defesa; um método de levantar questões e de criticar argumentos; um protesto contra a desigualdade na luta pela existência.” (Nash, 1985)
  7. Relevância do estudo “Para muitos de nós, o humor é

    mais do que uma agradável decoração da vida; é uma peça complexa do equipamento da vida, um modo de ataque e uma linha de defesa; um método de levantar questões e de criticar argumentos; um protesto contra a desigualdade na luta pela existência.” (Nash, 1985) "Sem a existência da língua, cultura e valores, ninguém morre de rir. Ou melhor não há riso.” (DaMatta, 2015)
  8. Relevância do estudo “Para muitos de nós, o humor é

    mais do que uma agradável decoração da vida; é uma peça complexa do equipamento da vida, um modo de ataque e uma linha de defesa; um método de levantar questões e de criticar argumentos; um protesto contra a desigualdade na luta pela existência.” (Nash, 1985) "Sem a existência da língua, cultura e valores, ninguém morre de rir. Ou melhor não há riso.” (DaMatta, 2015) “É preciso dar poder para as pessoas, que elas aprendam a dominar suas práticas e por isso vivam em paz com as suas escolhas e entendam as escolhas dos outros.” (Oliveira, 2015)
  9. Referências teóricas • Humor Conversacional (Tannen, 1989; Coates, 2003; Davies,

    2003) • Humor e Face (Béal e Mullan, 2013) • Impolidez (Culpeper, 1996; 2010) • Falsa impolidez (Leech, 1983; Haugh & Bousfield, 2012) • Impolidez de entretenimento (Culpeper, 2010)
  10. Referências teóricas • Humor Conversacional (Tannen, 1989; Coates, 2003; Davies,

    2003) • Humor e Face (Béal e Mullan, 2013) • Impolidez (Culpeper, 1996; 2010) • Falsa impolidez (Leech, 1983; Haugh & Bousfield, 2012) • Impolidez de entretenimento (Culpeper, 2010) • Interação conversacional (Schegloff, 1981; Hakulinen, 2009)
  11. Referências teóricas • Humor Conversacional (Tannen, 1989; Coates, 2003; Davies,

    2003) • Humor e Face (Béal e Mullan, 2013) • Impolidez (Culpeper, 1996; 2010) • Falsa impolidez (Leech, 1983; Haugh & Bousfield, 2012) • Impolidez de entretenimento (Culpeper, 2010) • Interação conversacional (Schegloff, 1981; Hakulinen, 2009) • A relação entre amigos (Rezende, 2002)
  12. Metodologia • Pesquisa qualitativa de base interpretativista – Análise da

    conversa de um grupo de 10 participantes das camadas médias do Rio de Janeiro.
  13. Metodologia • Pesquisa qualitativa de base interpretativista – Análise da

    conversa de um grupo de 10 participantes das camadas médias do Rio de Janeiro. • Procedimentos:
  14. Metodologia • Pesquisa qualitativa de base interpretativista – Análise da

    conversa de um grupo de 10 participantes das camadas médias do Rio de Janeiro. • Procedimentos: 1- Descrever as sequências de humor; 2- Mapear os tipos de humor que emergem nessas sequências e 3- Identificar as funções que elas desempenham nas conversas.
  15. Primeiros resultados • Os encontros analisados são eventos movidos a

    troca de amenidades, assuntos leves e orientados para o entretenimento, já que as brincadeiras são atividades recorrentes. Essa orientação justifica não só a busca contínua de gatilhos que provoquem o riso, mas também o uso do humor como reparador de momentos em que o clima “social’ do encontro possa estar em risco.
  16. Sobre a construção interacional do humor • Como nasce uma

    sequência humorística: Uma sequência humorística nasce quando um participante “caça” ou um outro participante “deixa” um gatilho para rir de alguém – o alvo. Esses dois participantes constituem a célula básica da sequência humorística.
  17. Sobre a construção interacional do humor • Como nasce uma

    sequência humorística: Uma sequência humorística nasce quando um participante “caça” ou um outro participante “deixa” um gatilho para rir de alguém – o alvo. Esses dois participantes constituem a célula básica da sequência humorística. 34 Diego GENTE mas você trouxe isso pra quem? 35 Gil é PRA QUEM HEIN? 36 Aurora ué quem é que gosta de brinquedinho de 37 meninos?
  18. Sobre a construção interacional do humor • Como cresce uma

    sequência humorística: 1- Uma sequência humorística cresce quando quem propôs o gatilho recebe o apoio do próprio alvo.
  19. Sobre a construção interacional do humor • Como cresce uma

    sequência humorística: 1- Uma sequência humorística cresce quando quem propôs o gatilho recebe o apoio do próprio alvo. 2- Uma sequência humorística cresce quando outros participantes “entram na brincadeira” para sustentar, ampliar o escopo do que foi tornado risível, ou para tornar risível quem provocou.
  20. Sobre a construção interacional do humor 38 Diego ah ainda

    bem que [você trouxe 39 Fabio [como que [como que a 40 gente viveu sem isso até hoje? 41 Diego num é?
  21. Sobre a construção interacional do humor • Como morre uma

    sequência humorística: A sequência morre quando ocorre o turno do alvo em resposta a todas as ações humorísticas. Essa resposta pode ser a de aceitação da brincadeira, ou de rejeição. Esse par básico pode ser ampliado, de acordo com a maturidade do humor ou da negociação entre alvo e provocadores.
  22. Sobre a construção interacional do humor 12 Diego eu queria

    entender porque que a pessoa demora 13 uma tarde inteiri:nha a- pra preparar um 14 rolinho sem vergonha desses? (1.0) [e ainda 15 aparece aqui com um gordo, um ma- um pequeno, 16 um £gigante. 17 Aurora [rolinho 18 não. salgadinho vai. 19 Jamil rolinho primavera de [legumes. é engenheiro 20 agora ele? 21 Marcio [((ri))SALGADINHO é 22 sacanagem.
  23. Sobre os tipos de humor • A ironia aparece como

    uma performance, levando em conta seu aspecto interacional e pode revelar posicionamentos do self sem ser necessariamente depreciativa.
  24. Sobre os tipos de humor • A ironia aparece como

    uma performance, levando em conta seu aspecto interacional e pode revelar posicionamentos do self sem ser necessariamente depreciativa. • Ao mesmo tempo que o grupo ri, encenando aquilo que despreza, o grupo também é irônico sem alvo específico, podendo gerar avaliações neutras que apenas ocupam os espaços esperados.
  25. Humor fantasioso • As sequências longas são maioria (Holmes e

    Marra, 2002). Há, em geral, contribuições de diversos participantes para a construção de eventos e cenários de forma caricaturada ou nonsense.
  26. Humor fantasioso • As sequências longas são maioria (Holmes e

    Marra, 2002). Há, em geral, contribuições de diversos participantes para a construção de eventos e cenários de forma caricaturada ou nonsense. • Comumente precedido por Casos de Formulação Extrema (Pomerantz, 1984).
  27. Humor fantasioso • As sequências longas são maioria (Holmes e

    Marra, 2002). Há, em geral, contribuições de diversos participantes para a construção de eventos e cenários de forma caricaturada ou nonsense. • Comumente precedido por Casos de Formulação Extrema (Pomerantz, 1984). • Duas subcategorias de humor fantasioso: exagerado e absurdo.
  28. Humor fantasioso • Principal Diferença entre humor fantasioso exagerado e

    humor fantasioso absurdo: A quebra de expectativa do humor fantasioso absurdo não reside, como no humor fantasioso exagerado, no contraste de mundos e valores, mas no contraste entre o absoluto absurdo e o que se entende como um padrão de normalidade.
  29. Zombaria jocosa • Dentre as zombarias jocosas, há aquelas que

    tem o self de um dos participantes como alvo e as híbridas, que mesclam zombarias envolvendo o self, um objeto ou uma terceira pessoa.
  30. Zombaria jocosa • Dentre as zombarias jocosas, há aquelas que

    tem o self de um dos participantes como alvo e as híbridas, que mesclam zombarias envolvendo o self, um objeto ou uma terceira pessoa. 1 Letícia é muito fácil↓ (.) são quatro 2 maracujás, mas te- 3 Diego [QUATRO maracujás↑] ca:ra:ca 4 vamos dormir aqui até terça de manhã 5 Letícia [-que ser maracujá fruta] 6 Fabio [((ri))] 7 Aurora [((ri))] 8 Letícia [((ri)) mas quatro é muito?
  31. Zombaria jocosa 9 Diego é pra is- só assim mesmo

    que ((o nome 10 de Denis))te aguenta, né? 11 Fabio e o [leite condensado↑] 12 Diego [qua↑tro↑] cara 13 Letícia leite condensado é uma só.
  32. Zombaria jocosa 9 Diego é pra is- só assim mesmo

    que ((o nome 10 de Denis))te aguenta, né? 11 Fabio e o [leite condensado↑] 12 Diego [qua↑tro↑] cara 13 Letícia leite condensado é uma só. • Muitas vezes a zombaria tem por trás uma proposta pragmática que vai além de garantir o entretenimento no grupo. Algumas vezes é através dela que são fortalecidos os valores do grupo ou que se mostram posicionamentos críticos e agressivos.
  33. Funções do humor • O entretenimento pelo prazer de entreter.

    • Dentre as ‘deixas’ ou gatilhos que são tomados como objeto de humor, alguns deles esbarram em limites impostos pelo self. Existem alguns atributos identitários que são considerados valiosos para o self e por isso são reivindicados em interação.
  34. Funções do humor • O entretenimento pelo prazer de entreter.

    • Dentre as ‘deixas’ ou gatilhos que são tomados como objeto de humor, alguns deles esbarram em limites impostos pelo self. Existem alguns atributos identitários que são considerados valiosos para o self e por isso são reivindicados em interação. • Primeiro cenário: insistência do enquadre de humor até o alvo ceder e autorizar a brincadeira, muitas vezes contribuindo com mais humor, garante-se assim um clima amistoso.
  35. Funções do humor • Segundo cenário: insistência do enquadre de

    brincadeira acaba gerando desconforto, visto que o participante-alvo não abre mão de sua reivindicação e não entra na brincadeira. Neste caso, há mais ameaça do que prazer na brincadeira, são piadas de mau gosto que aproximam humor mais de impolidez do que da esperada falsa impolidez.
  36. Considerações finais • Embora não fossem tão recorrentes os momentos

    de não aceitação do humor, fica evidente que, para o grupo, o humor não é uma coisa sagrada. Sagrada é a relação com o amigo. Na maioria das vezes, perde-se a piada, mas não o amigo. Os limites do exagero são interacionalmente construídos. É no curso da interação que descobrem do que lhes é permitido rir. A qualquer sinal de veto – não aceitação da brincadeira –, um recuo é recomendado.
  37. Considerações finais • Embora não fossem tão recorrentes os momentos

    de não aceitação do humor, fica evidente que, para o grupo, o humor não é uma coisa sagrada. Sagrada é a relação com o amigo. Na maioria das vezes, perde-se a piada, mas não o amigo. Os limites do exagero são interacionalmente construídos. É no curso da interação que descobrem do que lhes é permitido rir. A qualquer sinal de veto – não aceitação da brincadeira –, um recuo é recomendado. • “Sem a existência da língua , cultura e valores, ninguém morre de rir. Ou melhor não há riso“ (DaMatta, 2015)
  38. Considerações finais • O estudo aponta para a necessidade de

    um olhar intercultural voltado para o humor conversacional.
  39. Considerações finais • O estudo aponta para a necessidade de

    um olhar intercultural voltado para o humor conversacional. • Num quadro mais grave e mais amplo, o atentado terrorista aos cartunistas franceses aponta para outra questão: a relação entre humor e liberdade de expressão. Longe de se justificar o ato terrorista, temos que, pelo menos, reconhecer que essa discussão também envolve uma questão cultural: laicidade como marca da cultura francesa torna o humor sagrado; já para os islâmicos, o que é sagrado é a fé.
  40. Referências • COATES, J. Talk in a play frame: More

    on laughter and intimacy. Journal of Pragmatics 39: 29-49, 2007. • DAVIES, C. Ethnic jokes, moral values and social boundaries. British Journal of Sociology 33 (3), 383-403, 1982. • BÉAL. C. & MULLAN, K. Issues in conversational humour from a cross-cultural perspective: comparing French and Australian corpora In: PEETERS, B.; MULLAN, K.; BÉAL, C. (Eds.) Cross-Culturally Speaking, Speaking Cross-Culturally. Cambridge: Cambridge Scholars Publishing, 2013. p.107-140. • DAMATTA, R. Sobre o riso e a gargalhada. Jornal O Globo. Rio de Janeiro, 21 de janeiro de 2015. Primeiro Caderno, p.17. • HAKULINEN, A. 2009 Conversation types In: S. D’HONDT, S; ÖSTMAN, J; VERSCHUEREN, J. (Eds.) The Pragmatics of Interaction. Amsterdam: John Benjamins, 2009, p. 55-65.
  41. Referências • HAUGH, M. Jocular mockery, (dis) affiliation, and face.

    Journal of Pragmatics 42, p. 2106 - 2119, 2010. • _______. Conversational interaction. In K. M. Jaszczolt and Keith Allan (eds.), Cambridge Handbook of Pragmatics (pp.251-274), Cambridge University Press. Cambridge, 2012. • HAUGH. M. & BOUSFIELD, D. Mock impoliteness, jocular mockery and jocular abuse in Australian and British English. Journal of Pragmatics 44, p. 1099-1114, 2012. • LEECH, G. Principles of Pragmatics. New York: Longman, 1983. • NASH, W. The language of humor. London: Longman, 1985. • REZENDE, C. B. Os significados da amizade: duas visões de pessoa e sociedade. Rio de Janeiro: Ed. FGV, 2002.
  42. Referências • TANNEN, D. Talking voices: repetition, dialogue, and imagery

    in conversational discourse. Cambridge: CambridgeUniversity Press, 1989. • SCHOPENHAUER, Arthur. "O Mundo como vontade de Representação (livro III), Crítica a Filosofia Kantiana, Pererga e Paralipomena". Coleção Os Pensadores, São Paulo, Nova Cultural, 1988. • POMERANTZ, A. Agreeing and disagreeing with assessments: some features of preferred/dispreferred turn shapes. In: ATKINSON, J.; HERITAGE, J. Structures of Social Action: Studies in Conversation Analysis. Cambridge: Cambridge University Press, p. 57-101, 1984.