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Problemas e a arte de resolvê-los

Problemas e a arte de resolvê-los

Paulo Bordoni

March 18, 2019
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  1. Prof. Paulo R. G. Bordoni LNCC UFRJ Problemas e a

    arte de resolvê-los Prof. Paulo R. G. Bordoni LNCC UFRJ
  2. Esse conjunto de transparências é dedicado ao entendimento do conceito

    de problema e de métodos para a resolução de problemas
  3. Mestre, explique melhor o que é, que coisa é, um

    problema? Loirinha, esta é uma pergunta aparentemente simples, mas com uma resposta difícil. Vamos pedir ajuda ao Polya.
  4. A tradução do livro para o português é do Prof.

    da PUC-Rio, João Bosco Pitombeira. Busque na Internet e leia “How to solve it, G. Polya – Resumo” Vai ajudar vocês!
  5. Dados Resultados Problema Condição Mestre Polya nos ensinou que os

    ingredientes essenciais de um problema são os dados, a condição e os resultados.
  6. Dados Resultados Problema Condição Galileu, dados e resultados são conjuntos

    de coisas, objetos, associados ao problema, não? Entretanto a condição é algo mais abstrato, difícil de especificar. Como isto pode ser feito?
  7. Loirinha querida, os matemáticos amarram essas três entidades através do

    conceito abstrato de relação! Dados Resultados Problema Condição
  8. Nunca imaginei que uma relação pudesse ser colocada em termos

    matemáticos! É, o amor é algo abstrato: amarra homens e mulheres, formando casais!
  9. Dados dois conjuntos X e Y, uma relação entre X

    e Y é um subconjunto do produto cartesiano × de X e Y: ⊆ × E como a matemática define uma relação, Mestre?
  10. × , R Assim, uma relação é (idêntica a) um

    gráfico (o seu). Simplesmente um subconjunto de × . Em outras palavras uma relação ⊆ × é um conjunto de pares ordenados (, ) ∈ × com ∈ e ∈ .
  11. × , R E quando , ∈ escrevemos . Claramente

    poderão existir pares , ∈ × para os quais que , ∉ .
  12. 1,3 × [1,2] 2 1 3 1 2 Vejam a

    relação ≥ em [1,3] × [1,2]: Escrevemos ≥ quando , ∈ ≥ . ,
  13. −1,1 × [−1,1] 1 1 −1 −1 2 + 2

    = 1 A circunferência de raio 1, centrada na origem, é a relação descrita por 2 + 2 = 1 em [−1,1] × [−1,1]:
  14. × R () ℐ() O domínio () da relação R

    é o subconjunto de X definido por: = ∈ ∃ ∈ , ∈ } A imagem ℐ() da relação R é o subconjunto de Y definido por: ℐ = ∈ ∃ ∈ , ∈ }
  15. × R () ℐ() Mestra, dada uma relação ⊂ ×

    se ∈ () e ∈ ℐ() podemos garantir que ? Não Loirinha! Todos os pontos na região amarela do desenho satisfazem suas condições mas estão fora de R.
  16. × R Situação proibida para funções. y z Funções constituem

    casos particulares de relações que satisfazem a exigência adicional: ⟹ = .
  17. Funções descrevem relações de causa e efeito. Uma causa não

    pode possuir mais que um efeito. Efeito Outro efeito Causa
  18. × f = () Face à ideia de descrever relações

    de causa e efeito, as funções são anotadas previlegiando a direção: : → com = ().
  19. × f = () Também, por descrever relações de causa

    e efeito, para funções há a exigência adicional de serem definidas para todo elemento ∈ . Em outras palavras, se ⊂ × é uma função, então = . Entretanto não se exige que ℐ = . Por isto Y é denominado contradomínio.
  20. −1,1 × [−1,1] 1 1 −1 −1 2 + 2

    = 1 A relação 2 + 2 = 1 em [−1,1] × [−1,1] não define uma função. Entretanto, em [−1,1] × [0,1], ela define uma função.
  21. Um problema direto é aquele em que são conhecidos os

    dados, elementos do conjunto ⊂ e, para cada ∈ (), a resposta que queremos obter é o elemento ∈ ℐ() tal que . ℐ() () , R Dado Resposta
  22. Face à ideia de causa e efeito, os problemas diretos

    estão associados a funções. Sim, porque a ideia subjacente é: Para um valor ∈ , dado, calcular aquele ∈ ℐ() para o qual = ().
  23. ℐ() () , R Y Um problema inverso é aquele

    em que os dados (o que conhecemos) são elementos do conjunto e, para cada ∈ , a resposta (o que desejamos conhecer) é algum elemento ∈ () tal que . A incógnita é a resposta que buscamos. Resposta Dado
  24. Problemas inversos normalmente são mais complexos, pois envolvem a descoberta

    da incógnita: ∈ tal que , para ∈ dado. Os problemas inversos estão associados a equações.
  25. Resolver um problema inverso normalmente envolve a resolução de uma

    equação. A equação é uma descrição da condição.
  26. Não precisa gritar Loirinha, não sou surdo! Darei agora uma

    resposta mais ampla que a da Mestra à sua pergunta Ela envolve três campos do conhecimento humano: Lógica, Linguagens e Matemática.
  27. O Cálculo Proposicional, apresentado por G. Boole em “The Laws

    of Thought”, (1854) é uma forma algébrica de lidar com a Lógica. Eis a Matemática se apresentando na Lógica!
  28. Imagino o Cálculo Proposicional na Lógica como o equivalente ao

    Cálculo Diferencial e Integral I na Matemática. Boa comparação Cabelos de Fogo. Pensando assim, os silogismos de Aristóteles correspondem ao Pré-Cálculo!
  29. Sim coleguinha, o mesmo das tabelas-verdade, mas com leis envolvendo

    proposições , , , … , os conectivos lógicos ∧,∨, →, ↔ e a negação ¬. Por exemplo uma das Leis de DeMorgan: ¬ ∨ ⟺ (¬ ∧ ¬) Cálculo proposicional ?! Eu trabalhei com tabelas-verdade, usando V para verdadeiro e F para falso.
  30. Precisaremos ir além do Cálculo Proposicional, jovens. Precisaremos do Cálculo

    de Predicados. De tão sofisticado, o Cálculo de Predicados corresponde ao Cálculo Diferencial e Integral IV!
  31. Frege revolucionou a lógica quando criou o que é conhecido

    hoje como “cálculo de predicados”. Seus primeiros resultados foram publicados em 1.879, no livro Begriffsschrift (Conceitografia).
  32. Na sua Conceitografia, G. Frege, estabeleceu claramente conceitos como os

    de função e de variável lógica. A ideia de sentença aberta (), numa variável é dele. Ela não é nem verdadeira nem falsa. Porém quando substituímos por algum valor, podemos então decidir seu valor lógico. Por exemplo, se () ≡ ( 2 − 2 = 0 ) então é verdadeira para = 2.
  33. Observem que no cálculo de predicados, entramos no interior das

    sentenças, transformando-as em proposições lógicas ao instanciarmos (i.é, atribuirmos algum valor) suas variáveis. As ideias de Frege permitiram o tratamento de questões lógicas impossíveis de serem representadas por meio do Cálculo Proposicional, de Boole.
  34. Além de instanciar variáveis, uma outra forma de fazer isso

    é utilizando os quantificadores: Ao quantificarmos uma sentença aberta numa variável , nós a transformamos numa proposição. Então ela poderá assumir um dentre os dois valores lógicos V ou F. ∀, ∃, ()
  35. Loirinha, eis a resposta ao seu grito de angústia: Uma

    equação é uma sentença aberta numa variável : ≡ [ () = 0 ] Valores de que tornam essa sentença verdadeira são raízes da equação = 0.
  36. Um exemplo, por favor! Tão límpido quanto água: A equação

    2 − 2 = 0 é a sentença aberta , na variável , definida por () ≡ (2 − 2 = 0).
  37. No caso dessa sentença () a afirmação ∃, () é

    verdadeira, ao passo que ∀, é falsa. Claro Mestre, ∃, () é verdadeira tanto para = 2 como para = − 2. Entretanto ∀, é falsa. Por exemplo, para = 1 temos 2 − 2 = −1 logo (1) é falsa.
  38. Detesto pedantismo Mestre, prefiro falar: “As raízes da equação =

    0 são ...” Eu também! Portanto 2 e − 2 são raízes da equação 2 − 2 = 0.
  39. Agora vou encerrar essa digressão lógica, e retornar aos problemas

    e relações. Mais sobre lógica no apêndice 2.
  40. Meditei sobre o assunto e concluí que problemas e relações

    são a mesma coisa. Apenas vestem roupas diferentes, como Super Homem e Clark Kent. Concordo Loirinha. E nas HQ da Marvel Comics há muitas outra identificações: • Homem de Ferro e Tony Stark; • Batman e Bruce Wayne; • Homem Aranha e Peter B. Parker; • ...
  41. A diferença é que o conceito de relação é como

    se fosse uma foto do todo e o de problema junta uma pergunta à foto. Que clareza! Você foi lá no fundo dos conceitos, Cabelos de Fogo!
  42. E também poderão existir mais do que um elemento ∈

    cumprindo a condição. Então a equação possui mais de uma solução. Um problema inverso (equação) pode não ter solução! É quando não existe nenhum elemento ∈ cumprindo a condição.
  43. É, e lembrando que não existe ∈ ℝ tal que

    2 = −1, temos um problema (equação) sem nenhuma solução. É mesmo Filósofo, o problema (equação): Obter ∈ ℝ tal que 2 = 1, possui duas soluções: = ±1 .
  44. A lista é grande e depende do problema. Por ex.:

    • No caso de equações polinomiais o conjunto das soluções (as raízes) está em em ℂ, com algumas, eventualmente, em ℝ. • No caso dos sistemas de equações lineares a incógnitas reais, o conjunto das soluções está em ℝ. Ou ℂ para incógnitas complexas. Mestre, cite alguns outros problemas inversos importantes.
  45. Outros exemplos: • Sistemas de equações não-lineares; • Equações matriciais;

    • Equações diferenciais ordinárias (EDO’s) e problemas de valor inicial; • EDO’s e os problemas de valor de contorno; • Equações diferenciais parciais e problemas de valor de contorno (eqs. elípticas). • Equações diferenciais parciais e problemas de valor inicial (eq. de calor e eq. da onda); • Cálculo de autovalores e os correspondentes autovetores;
  46. R −1 = Dada uma relação ⊂ × a relação

    inversa −1 de R é definida por: −1 = , ∈ × (, ) ∈ } Para relações ⊂ ℝ2, a relação inversa −1 é o reflexo de R no espelho = .
  47. Y X −1 Lembro que um problema inverso pode ser

    transformado num direto através da relação inversa. A inversa de uma função nem sempre é função. Pensem em () = 2
  48. A inversa de ↦ = 2 é ↦ = ,

    mas só para ≥ 0. Sim, Surfista. Ela fornece a solução para o problema inverso: dado ≥ 0, qual é o valor de ∈ ℝ para o qual 2 = .
  49. E como o Mestre falou, o gráfico de ↦ é

    a imagem no espelho ↦ do gráfico de ↦ 2. Fiz o gráfico das duas e também da reta = . Notem que a escala do eixo-y é o dobro da escala do eixo-x.
  50. Sempre tendo todos os cuidados com relação a domínio, contradomínio

    e imagem, como fez o Surfista. Dados Incógnita Problema Condição A solução de um problema inverso associado a uma relação R (ou uma função f ) é sempre dada pela relação inversa −1 (ou pela função inversa −1).
  51. Dados Incógnita Problema Condição Ruim, Sherlock? Sim Loirinha, considere o

    problema inverso: Obter, quando possível, um vetor tal que = , para e dados.
  52. Bahh! Estudamos em Álgebra Linear que a solução é dada

    por = −1, quando a matriz A é inversível. Claro colega, pois nesse caso teremos: = −1 = −1 = =
  53. Pois é sabichão, mas computacionalmente não é assim que procedemos!

    Mais adiante no curso vamos analisar esse problema e você entenderá por quê.
  54. Uma forma de resolver problemas inversos é utilizando soluções de

    problemas diretos. Mestra, sinceramente, não entendi o trocadilho!
  55. Não é trocadilho, Cabelos de Fogo. O que você faz

    para dividir um inteiro por outro inteiro ? Sim, como você calcula Τ 20 5 ?
  56. A bem da verdade, várias vezes. Usou a tabuada da

    multiplicação, até obter a igualdade. 5 x 1 = 5 5 x 2 = 10 5 x 3 = 15 5 x 4 = 20 É !
  57. É, mas e no caso de 23/5 em que a

    divisão não dá exata – o resto não é zero ? 23 5 4 -20 3 Sim, e usou a definição de múltiplo inteiro para fazer a divisão: Τ 20 5 = 4 ↔ 5 × 4 = 20
  58. 23 5 4 -20 3 Um quociente 4 e resto

    3. Portanto o resultado é 3,6. 30 5 6 0 30 = 3 x 10 e
  59. Vocês recorreram a três problemas diretos e ao conhecimento da

    representação decimal dos números: Não Mestra, foi feita uma subtração, que é um problema inverso !
  60. Seja mais explícita na sua pergunta Loirinha ! Eu quero

    saber se sempre resolveremos problemas inversos por meio de uma quantidade finita de problemas diretos.
  61. Não coleguinha, as dízimas periódicas respondem tua pergunta ! É

    verdade, Cabelos de Fogo! Uma dízima periódica é um número decimal com um grupo de dígitos após a vírgula se repetindo, sem parar !
  62. Claro: Τ 7 3 = 2,33 … = 2, ത

    3 Τ 13 7 = 1,451328 451328 … = 1, 451328 Você repete as operações até obter uma aproximação satisfatória !
  63. Este é um exemplo de método iterativo. A solução aproximada

    é obtida por uma repetição de métodos diretos. Entra em jogo a noção de convergência de uma sequência.
  64. Um outro problema inverso clássico é a determinação das raízes

    de uma equação do 2º grau: 2 + + = 0, ≠ 0. Sim, as soluções (são duas) do problema são dadas pela conhecidíssima fórmula de Bhaskara.
  65. É isso aí Cabelos de Fogo: ± = − ±

    2 − 4 2 . São sempre duas raízes reais, iguais ou complexas e essa decisão é feita em função do valor de ∆ = 2 − 4. E todo mundo sabe que: • ∆ > 0 ∶ + , − ∈ ℝ • ∆ = 0 ∶ + = − ∈ ℝ • ∆ < 0 ∶ + , − ∈ ℂ
  66. 1. Calculamos ∆ = 2 − 4 (4 operações diretas),

    2. Efetuamos a decisão em função do valor de ∆, (1 decisão), 3. Admitindo p/ex. que ∆ > 0, calculamos o número real ∆ (mais uma operação direta), 4. Calculamos − + ∆ (8 operações diretas) e − − ∆ (9 operações diretas) 5. Achamos + dividindo − + ∆ por 2 (10 operações diretas) e − dividindo − − ∆ por 2 (11 operações diretas no total) Observem que as raízes + e − são calculadas por uma sequência finita de operações elementares:
  67. Observem que resolvemos um problema inverso por meio de 11

    operações simples, diretas. Isto porque a solução foi dada por meio de 2 fórmulas!
  68. Só para fechar, a resolução de sistemas lineares = é

    um problema importantíssimo para a ciência e a tecnologia. Quero adiantar que a humanidade sabe como resolver sistemas lineares à muito tempo e dois métodos diretos para resolvê-los são: • A regra de Cramer, • O método de eliminação de Gauss.
  69. Pois é Galileu, mostraremos em breve que a regra de

    Cramer é inviável para sistemas lineares de ordem maior que 3.